

Conforme declarações da audiologista Catarina Korn à Agência Lusa em Junho de 2007, a exposição a um volume sonoro de 100 dB durante 15 minutos “ainda é aceitável, mas cada minuto a mais já tem implicações graves na audição”, lembrando que “a intensidade sonora em locais como discotecas pode atingir ou mesmo exceder os 120 dB, ultrapassando os limites considerados de risco para a audição” [NR.: acima dos 85 dB].

A velha máxima “we like it loud” traduz bem os fundamentos do Rock N’ Roll. De facto, cedo nos habituámos a ouvir dizer que o Rock (e especialmente o Metal) deve ser escutado bem alto para ser devidamente apreciado. Fazêmo-lo em casa, no carro, na sala de ensaios, nos locais de espectáculo. Tornou-se uma forma de vida. Prejudicial a médio/longo prazo, mas ainda assim uma forma de vida.

Ou seja, em eventos públicos, o volume excessivo de decibéis emitidos constitui uma forma simples de, em certa medida, “manipular” o comportamento da assistência (naquilo a que alguns cientistas chamam Psicologia das Multidões). Com base no processo descrito, as bandas e o staff esperam garantir uma receptividade calorosa, dominando mais facilmente o público desde a primeira nota. Além disso, o desgaste físico resultante desse estado geral de euforia (que as drogas e o álcool exacerbam) impele a assistência a consumir mais alimentos e bebidas, aumentando as receitas do espaço.

Os acufenos são irreversíveis e incómodos, especialmente em ambientes sossegados, onde os zumbidos assumem preponderância, tornando-se mais ou menos difíceis de suportar, conforme a gravidade da doença. Padeço destes sintomas há dois anos, resultantes da utilização regular de headphones (abordarei a questão da perda auditiva induzida por aparelhos de música portáteis na terceira parte deste artigo). Felizmente, o meu caso não é grave. Por enquanto, pelo menos (durante seis meses tomei medicação e as melhoras foram notórias, mas após o fim do tratamento regressei à estaca zero). Adaptei-me a esta condição, mas “a tolerância aos acufenos varia consideravelmente de pessoa para pessoa e é largamente determinada pela personalidade do doente” [Enciclopédia de Medicina. (1992). Vol. A-H. Lisboa: Selecções do Reader’s Digest, p.72] , tendo já sido registados, inclusive, suicídios decorrentes da intolerância aos zumbidos permanentes, em especial quando assumem grande intensidade.
Vazio legal penaliza o consumidor

Ou seja, a RGR apenas é aplicável “às actividades ruidosas permanentes ou temporárias, bem como ao ruído de vizinhança e outras fontes de ruído susceptíveis de criar incomodidade (…)”.O consumidor fica, pois, à mercê das consequências de eventuais perdas auditivas induzidas pelo ruído intenso em eventos públicos, bem como da utilização de aparelhos de MP3 ou análogos.
Através de contacto telefónico, a Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor (Deco) informou-me que, para fazer valer os seus direitos, o doente terá que abrir um processo judicial, provando os danos auditivos através de exames e relatórios médicos. Só então poderá requerer uma indemnização à entidade em causa.
Já em 2006 a Secretaria de Estado do Comércio, sob a tutela do Ministério da Economia, recusara explicar ao Diário de Notícias (22.03.06) a eventual existência de planos para legislar, a curto ou longo prazo, nesta matéria. Hoje, tudo continua em aberto, mas é urgente inverter a situação, estabelecendo-se um nível sonoro máximo proporcional às dimensões de cada sala, à respectiva taxa de ocupação em cada evento e à tecnologia acústica disponível.
Na ausência de vontade política para legislar nesta matéria, terá que ser o consumidor a bater-se pelos direitos que lhe assistem, promovendo tertúlias com especialistas e petições visando o debate sobre o tema na Assembleia da República. Uma vez alcançado este objectivo, cabe ao Governo, através do Ministério da Saúde, em parceria com a SPORL (Sociedade Portuguesa de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial) e demais entidades públicas ou privadas desenvolver atempadamente acções pedagógico-informativas de sensibilização junto dos profissionais da indústria, dos adolescentes e pais / encarregados de educação, das escolas, discotecas, salas de espectáculos, etc. No fundo, é toda uma nova mentalidade que se impõe. E urgentemente.
Songs for the deaf

Segundo especialistas alemães, um quarto dos jovens germânicos apresenta danos auditivos gerados por dispositivos de música portátil e exposição prolongada a volumes sonoros extremos, calculando-se que 33% terá que usar aparelhos auxiliares da audição aos 50 anos, na melhor das hipóteses. Nos Estados Unidos 50% dos estudantes universitários apresenta sintomas de perda auditiva, estando os acufenos e a necessidade de aumentar o volume da TV ou do rádio entre os principais.
Num inquérito recente elaborado pela Harvard School of Public Health no site da MTV sobre a atitude dos adolescentes face a diversas questões de saúde, apenas oito por cento dos cerca de 10 mil respondentes (na maioria com idades inferiores a 21 anos e frequentadores habituais de espectáculos ao vivo e discotecas) afirmou considerar a perda auditiva “um grande problema”. Dois terços dos inquiridos afirmaram sofrer ou já terem sofrido de perda auditiva e / ou acufenos. Segundo o Observer Music, 42% dos fãs britânicos de música não vêem a perda auditiva como algo preocupante, sendo que apenas quatro por cento usa tampões nos espectáculos ao vivo.
Prevenir para não remediar

Também os norte-americanos Mötley Crüe já desenvolveram acções similares, permitindo a venda de tampões nos seus espectáculos. Aliás, a visibilidade pública dos músicos coloca-os num patamar privilegiado de sensibilização dos fãs quanto à prevenção. Porém, devido à natureza da profissão, os executantes, bem como produtores, engenheiros de som, etc., são igualmente vítimas frequentes de sérios problemas auditivos. Com efeito, a surdez entre os profissionais da música é um dos segredos e tabus melhor preservados da indústria. Dele falarei em “A surdez como forma de sobrevivência”, o segundo artigo desta série, a publicar brevemente.

4. A forma de utilização dos tampões é simples: basta apertá-los, um de cada vez, entre os dedos polegar e indicador em movimentos circulares até que o seu diâmetro fique consideravelmente reduzido. Depois, insira-o no pavilhão auricular, aguardando que se expanda progressivamente, eliminando o ruído em excesso. Repita a operação no outro ouvido
5. Insira os tampões 10 a 15 minutos antes de o espectáculo começar. Dessa forma haverá tempo suficiente para os testar (é normal ter que os colocar e retirar algumas vezes nas primeiras utilizações até encontrar o jeito) e para deixar que os tampões se expandam, adaptando-se anatomicamente ao ouvido. Além disso, o utilizador terá tempo de se habituar a um corpo estranho no ouvido e à nova percepção sonora
6. Mantenha os tampões colocados ao longo de todo o espectáculo, retirando-os apenas ao abandonar o recinto. Então, deite-os fora (os tampões clássicos não devem se reutilizados)
7. Oiça música a um nível médio ou baixo. Dessa forma a sua escuta é igualmente aprazível e não representa perigo
8. Se sentir zumbidos nos ouvidos, perda auditiva ou outros sintomas consulte um médico especialista.
9. O ouvido humano requer um descanso de 18 horas após exposição prolongada a intensos volumes sonoros. Antes disso, é desaconselhada a escuta de sons a níveis elevados
10. Deixe de fumar. O tabagismo duplica o risco de perda auditiva induzida pelo ruído. Após exposição a intensos volumes sonoros, as células nervosas do ouvido interno requerem uma boa circulação sanguínea. Fumar é uma das actividades que restringe a função cardiovascular, limitando o fluxo sanguíneo.
Dico
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